Se quer aplicar o seu dinheiro no sector, anote as dicas do especialista Vítor Marques da Cruz. O advogado lidera o MC&A Advogados, escritório criado em parceria com a SNR Dentons, um dos maiores do mundo e de África.
Revista Rumo (Entrevista de Rosália Amorim)
Se um investigador estrangeiro quiser apostar em hotelaria, em Angola, que regras legislativas deve ter em conta?
Na qualidade de investigador, e independentemente do sector, deverá, primeiro, ter em conta o quadro legal de investimentos do país, estipulado pela Lei de Investimento Privado (LIP), aplicável a projectos em que o investimento seja de, no mínimo, um milão de dólares. Deverá ter em conta os decretos que regulam o licenciamento da actividade hoteleira, o regime geral de concessão de terrenos, bem como as normas tributárias, cambiais e societárias pertinentes à actividade específica que pretende desenvolver. Por outro lado, na qualidade de estrangeiro, convirá conhecer o regime jurídico dos estrangeiros em Angola. Um acompanhamento jurídico especializado será, portanto, aconselhável.
Quais são as grandes limitações e/ou imposições ao investimento neste sector?
O sector não é, por enquanto, considerado pela ANIP como um dos sectores de investimento prioritário no país (como seria o caso, por exemplo, da agricultura ou da indústria transformadora), a cujos projectos mais facilmente poderão ser atribuídas, mediante negociação, as facilidades e isenções, legalmente previstas. Os elevados custos, característicos da realidade económica angolana, as especificidades do mercado imobiliário ou as difíceis condições das redes viárias em algumas zonas do país (não obstante as melhorias maciças verificadas nos últimos anos) poderão igualmente impor algumas limitações ao impulso inicial dos investidores nesta área. Por outro lado, haverá as mesmas imposições decorrentes da LIP para qualquer projecto de investimento, tais como: criação de emprego, formação de mão-de-obra nacional, progressiva angolanização dos quadros de direcção e chefia, cumprimento de prazos e planos estipulados, pagamento de impostos, defesa do meio ambiente, entre outras.
Se for empresário angolano, que benefícios tem?
As condições previstas na LIP são proporcionadas de modo semelhante a investidores nacionais ou estrangeiros. Os cidadãos angolanos, contudo, poderão investir no sector de hotelaria no âmbito do programa de apoio às micro, pequenas e médias empresas (MPME), sendo para o efeito necessário um investimento inicial substancialmente menor do que aquele exigido pela LIP, o que, por si só, acaba por constituir um benefício reservado ao empresariado nacional. Os nacionais poderão ainda usufruir de condições vantajosas no recurso ao crédito, no âmbito das MPME.
Há incentivos específicos consoante as províncias?
Os incentivos fiscais previstos na LIP, atribuídos mediante negociação e consoante o previsível impacto social e económico do projecto, serão diferentes conforme a zona de desenvolvimento em que o mesmo seja implantado. Assim e a título de exemplo, o período durante o qual o investidor beneficia de uma redução do percentual do imposto industrial (imposto sobre os lucros) poderá estender-se até dez anos caso o projecto hoteleiro seja desenvolvido na província do Bié (pertencente à zona de desenvolvimento C), enquanto na província de Luanda (pertencente à zona de desenvolvimento A) apenas beneficiaria de isenções ou reduções por um período máximo de até cinco anos. Tendo em conta a necessidade e intenção de atrair o investimento para áreas menos desenvolvidas do país, um projecto de investimento em turismo e hotelaria nestas zonas usufruirá de incentivos maiores e mais prolongados. Por outro lado, para além dos incentivos fiscais e aduaneiros legalmente previstos, a cada vez maior e melhor acessibilidade entre províncias, com forte crescimento das infraestruturas viárias, ferroviárias e aeroportuárias, bem como a magnificência e imponência da beleza natural de muitas províncias por todo o território angolano, funcionam igualmente como incentivos à iniciativa privada no sector hoteleiro, resultantes das enormes potencialidades de cada província para se transformar em pólo de atracção para diversos tipos de turismo.
Em que segmentos haverá mais oportunidades?
Embora se verifique um aumento das unidades hoteleiras, o sector hoteleiro continua por explorar, com 50% das estruturas de hotelaria já existentes a precisarem de ser reabilitadas e todo um mercado de novos projectos a implementar. Não obstante, começa a verificar-se já, em Luanda, uma saturação no segmento de luxo, pelo que, as maiores oportunidades de negócio, dentro do sector, encontram-se nas categorias de três e quatro estrelas. Trata-se de segmentos com bons índices de ocupação e em que a taxa de retorno entre o capital inicialmente investido (muitíssimo mais reduzido do que no segmento de luxo) a as receitas previsíveis (aproximadamente das do luxo) é mais vantajosa.
Considera que a banca angolana está disponível para conceder crédito para investimentos nesta área?
Não, a banca angolana não se encontra especialmente sensível para a concessão de crédito a projectos neste sector.
Os investidores portugueses têm vantagens face a outros investidores estrangeiros?
Não obstante o tratamento igualitário e indiferenciado que a LIP presta a todos os investidores privados, independentemente da nacionalidade ou país de origem, os investidores portugueses – que continuam ainda a representar uma das mais significativas fatias do bolo geral de investimento estrangeiro em Angola – naturalmente poderão usufruir nos negócios desenvolvidos dentro deste sector específico das vantagens decorrentes da ligação histórica entre Portugal e Angola.
Ainda há margem para crescer neste sector em termos de emprego?
Sim, sem dúvida. Angola apresenta um enorme potencial a nível de capital humano, que pode e deve ser desenvolvido no âmbito dos projectos de investimento estrangeiro. Tal consubstancia-se ainda nas exigências legais, dentro do quadro geral de investimentos do país, precisamente no sentido da criação de postos de trabalho, recrutamento e formação de mão-de-obra e quadros nacionais. Nestes termos, quanto maior o impacto social e económico previsível do projecto (o que é medido, entre outros factores, pela criação de emprego), maiores as probabilidades de o projecto usufruir de isenções e facilidades de longo prazo.
Já existe formação adequada no país para qualificar quadros e outros profissionais que queiram fazer carreira nesta área?
O sistema de ensino, dentro do contexto geral do país em termos de desenvolvimento, encontra-se ainda a dar os primeiros passos rumo aos standards de uma educação de qualidade, pelo que, actualmente, pode-se afirmar que a formação de quadros na área hoteleira ainda não é suficiente nem a mais adequada, tratando-se, assim, de mais um ramo em que a qualidade poderá crescer de mãos dadas com o investimento.